Maria Bethânia
Daqui a 35 anos, o disco Ciclo completará 70 anos de lançado. Caso alguém deseje escrever sobre a obra, e fazer algum comentário sobre Maria Bethânia, é provável que não encontrará noticiários sobre Bethânia como uma celebridade. Como a artista que vendeu milhões de discos ou que foi recordista de downloads. Dificilmente verá noticiários sobre a roupa que ela vestia ou se esteve em programas de auditórios, fazendo julgamento das qualidades musicais alheias.
O que será possível descortinar é a artista-cantora, que também declamava (e muito bem); descobrirão também que ela tinha um jeito muito gosto de dançar (descalça) e que cada música interpretada vinha embrenhada de uma história boa de se contar.
Ciclo
Este ano Ciclo completa 35 anos de lançado, e ainda lembro do primeiro momento que ouvi aquele LP, que trazia nas canções os sons misturados com os silêncios, num ritmo leve e gostoso. Ali eu escutava, dançava, meditava; enfim, deixava os sentimentos florescerem.
Venha, leitor fazer uma viagem pelos caminhos das boas canções.
Lado A
De casa eu podia ver Maria Bethânia dentro do trem. Era a Motriz, aquela maquinaria de trilhos que levava o povo de Santo Amaro a Salvador. Naquele tempo o Recôncavo ainda tinha muito verde rodeando as casas, e os trilhos eram trilhas para a imaginação.
Agora viajando na motriz, vejo Bethânia em volta de uma fogueira. Ao lado dela há uma outra mulher, a mulher escreve sobre o amor com muita profundidade. Enquanto ela escreve, Bethânia canta, olhando para cada verso que Ângela Rô Rô expressa.
Depois Bethânia sai em alvoroço e abraça Gal Costa: as duas em uníssono cantarolam versos simples da pura filosofia.
É quando Gil entoa versos tristes dos desencontros criados pelos deuses do Amor e da Solidão.
Bethânia então é puxada pela sensível língua poética de Moraes Moreira. A motriz já atravessou a Bahia e está em Portugal.
É quando um sopro soa aos ouvidos nos traços curtos de Braguinha, dizendo Anda Luzia, Anda Luzia...
Lado B
Estamos no meio do Ciclo, uma peça rara do cancioneiro popular. elo texto de Nestor Oliveira, musicado por Caetano Veloso. Agora me sinto num redemoinho, com aquelas folhas em movimento dançante, que me faz pensar a vida, a vivida e a não vivida.
É nesse movimento que Ary Barroso oferta Rio de Janeiro. Ah! Que toda energia seja nossa. Viva o povo Brasileiro!
Entre sacolejos da máquina de ferro, Gonzaguinha chama a doce e bárbara cantora para um canto que faça o sol adormecer. Aqui o dia e a noite entram em cópula, e o ser feliz é o que importa.
Neste momento já estamos em êxtase de tanta música boa, mas Lupicínio põe todo mundo em situação de porre. Faz uma música tão grandiosa que serve tanto à pontente voz de Jamelão quanto aos graves melódicos dessa grandiosa intérprete.
Nada melhor do que um bom vinho para se falar de amor, de prazer, da saudade de nosso corpo, que também é labirinto. Maria Bethânia dá voz a Naila Skorpio.
A motriz está terminando a jornada. A lua aparece para tornar o disco mais poético. Que combinação mais harmoniosa ouvir uma canção escrita por Mabel Veloso e musicada por Roberto Mendes.
Outros Lados
Quem teve o privilégio de adquirir o LP recebeu um encarte com as letras das músicas e um conjunto de texto denominado Outros Lados. Velhos Tempos quando uma obra musical não continha somente a música, mas trazia as letras e os contextos de produção da arte.
Olho daqui de 2018 e vejo a motriz voltando de Salvador para Santo Amaro, levando saudades e tendo impregnado em cada vagão um pouco da história da Música Popular Brasileira.
O que ouvi? Ciclo
De quem é a autoria? Maria. Bethânia
De quando foi? 1983
Quem produziu? Philips
O que achei? Maravilhoso!
Quais são as músicas?
Lado A
. Motriz
. Filosofia Pura
. Fogueira
. A Notícia
. Sonhei que estava em Portugal
. Ana Luzia
Lado B
. Ciclo
. Rio de Janeiro
. Cantar para fazer o sol adormecer
. Ela disse-me assim
. Vinho
. Lua
Até a próxima!
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